Ser político não vem no sangue — embora muita gente ainda tente provar o contrário, exibindo sobrenomes como se fossem títulos de propriedade. A verdade é que nenhum gene carrega vocação pública, nenhum DNA traz gravado o interesse coletivo. O que se herda, quando muito, são as histórias de família, as conversas na mesa, os exemplos — bons ou ruins — que rondam a infância. O resto é escolha pessoal, lapidada no atrito entre caráter e ambição. Há quem confunda berço com mérito, como se a cadeira do poder viesse acompanhada de manual de instruções passado de pai para filho. Mas política não é herança de fazenda. É um ofício que se constrói na prática, na escuta, no respeito, no senso de justiça. Ou, quando mal exercido, na sede de mando, na facilidade do atalho, no brilho perigoso das portas que se abrem ao toque de um sobrenome conhecido. O curioso é que os que mais se agarram a essa ilusão de linhagem são justamente os que menos entendem a essência do serviço público. Porque ser político — de verdade — não é desejar o poder, mas carregar o peso de usá-lo para algo que vá além do próprio reflexo no espelho. E isso não se herda: se aprende, se cultiva, se prova. No fim, a política é menos sobre sangue e mais sobre postura. Menos sobre apelido e mais sobre atitude. O poder pode até correr nas veias de algumas famílias, mas a responsabilidade de exercê-lo — essa, sim — só nasce em quem tem caráter para não deixar que ele suba à cabeça.